sábado, 26 de janeiro de 2013

Rock 'n' Roll em Portugal (1955-1959): Parte V



Tal como este e também do Porto, Walter Behrend e o seu Conjunto faz aproximações ao rock ‘n’ roll como mais um ritmo; de forma semelhante, Toni Hernandez e o seu Conjunto, grava um ritmado Baby Rock; o Conjunto de Jaime João toca o bizarro I Go Ape; e outros como o Conjunto Ligeiro Académico, dão provas que o rock ‘n’ roll chegou, de facto, a este pobre país. No fundo, vivia-se, como descreve Daniel Bacelar, num "ambiente fechadíssimo a qualquer coisa de diferente que aparecesse na altura e que pudesse pôr as pessoas a pensar e vir a descobrir que havia um outro mundo lá fora”. Talvez por isso não passasse tudo de “rockerzinhos de bairro a imitar os americanos para engatar as miúdas lá no bar”, como sintetiza José Cid…

Fora de Portugal continental, ainda neste final de década há ainda dois registos a assinalar. Em Moçambique, Victor Gomes inicia a sua carreira, acompanhado pelos Dardos, sendo logo eleito o Rei do Rock, e nos Estados Unidos um "rockabilly cult cat", ainda hoje obscuro, de nome Joe S. Alves grava dois singles em 1957, sob o nome de Portuguese Joe.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Rock 'n' Roll em Portugal (1955-1959): Parte IV


Babies

Igualmente na década de 50 surgem, em Coimbra, Os Babies, um conjunto que também toca rock ‘n’ roll. Formado por José Cid no rabecão, piano e voz, António Portela no piano e acordeão, António Igrejas Bastos na bateria e voz, e Carlos Nazaré na guitarra, o conjunto dura cerca de três anos mas não ficam registos a não ser fotográficos. Desfeito o grupo José Cid prossegue a sua carreira formando, em 1959, o Conjunto Orfeão de Coimbra juntamente com Daniel Proença de Carvalho, José Niza e Rui Ressurreição. Estes persistem durante algum tempo até que José Cid decide ir viver para Lisboa e juntar-se ao Conjunto Mistério. Rui Ressurreição também continuaria no mundo da música, fazendo posteriormente parte do Clube de Jazz do Orfeão Académico e mais tarde do Conjunto Hi-Fi e dos Álamos.

Pedro Osório
Com a maioria da imprensa centrada em Lisboa, a cobertura em termos musicais em relação ao Porto é quase inexistente. Das poucas referências existentes é a de Pedro Osório (1939-2012) que a partir de 1957 começa a fazer aparições públicas nas rádios e televisão. Em 1960 grava com o seu conjunto, formado por Francisco Ferreira da Silva, Pedro Nuno e José Couceiro, o EP Namorico da Rita. Um disco de quatro músicas de música ligeira com alguns contornos rock "civilizado". Nesse mesmo ano edita mais três discos, sempre com músicas mais ligeiras do que propriamente rock, e cantadas em português, inglês, francês e italiano, conforme ditavam as leis do mercado. No ano seguinte voltam a gravar mais um disco e só em 1967 é que Pedro Osório volta a estúdio em nome próprio. Nas décadas seguintes este tem uma prolífera carreira musical, fazendo parte dos Quinteto Académico e acompanhando ou fazendo arranjos musicais a Paulo de Carvalho, Luís Cília, Sérgio Godinho, José Almada, entre outros.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Rock 'n' Roll em Portugal (1955-1959): Parte III


Zeca do Rock

É também nesse final dos anos 50, que José das Doures começa a aprender a tocar guitarra. Estreando-se em 1959 no programa Bom Dia de José Oliveira Cosme é lá que recebe a alcunha pela qual hoje é conhecido, Zeca do Rock. Influenciado pelo rock 'n' roll norte-americano de então, canta em inglês e em português e opta ao contrário de outros, por fazer as suas próprias músicas. É dessa altura que data Nazaré Rock, que viria a ser gravada para o seu primeiro disco. Editado em 1961 este acabaria por ficar conhecido não pela referida música mas por outra, Sansão foi Enganado, música hoje recorrentemente referida por ser aquela em que ficou registado o primeiro yeah! gravado em Portugal…

Embora, julgando pelo conteúdo do disco, tudo aparente ser inocente ou convencional o seu percurso musical não o foi. Considerado "aos olhos do governo fascista” como “um opositor declarado, uma figura perigosa, incómoda, rebelde, capaz de liderar a juventude, o que representava um perigo para o sistema", conforme conta em entrevista a João Aldeia para o site vilardemouros1971, Zeca do Rock viu-se então remetido para as emissoras privadas e, nunca mais podendo gravar, teve de se cingir ao circuito das actuações ao vivo.

Apesar de tudo a sua carreira como Zeca do Rock durou sete anos e além do referido disco ficou também registado no filme de Henrique de Campos Pão, Amor e Totobola (1964), onde faz de líder de gang de rockers e canta Twist para Dois. No entanto, apesar de dizer que deixa a música, o seu nome reaparece em 1970, quando Sérgio Borges e o Conjunto Académico de João Paulo adaptam a sua composição Aguarela Portuguesa sob o nome O Lavrador e, em 1972, quando os mesmos gravam God of Negroes. Escrita aquando da sua estadia na Guiné, onde Zeca do Rock chegou a ter um conjunto, esta é, nas suas palavras, «uma balada pungente, verdadeiro “negro espiritual”, como apelo derradeiro para a salvação de um povo inocente e infeliz, a quem mais ninguém parecia poder socorrer». Pertinente para os tempos que então corriam…

domingo, 20 de janeiro de 2013

Rock 'n' Roll em Portugal (1955-1959): Parte II


Joaquim Costa e os Rapazes da Estrela

Nascido em Lisboa, Joaquim Costa (1935-2008) começa a cantar em 1955, pouco depois de ter descoberto o rock 'n' roll. Primeiro entre amigos, no liceu e em colectividades, e nunca se levando muito a sério, só em 1959 é que Joaquim Costa decide formar um grupo para o acompanhar. Com o nome Os Rapazes da Estrela, deste fizeram parte Sérgio Pinto, Arménio Bajouca, Luís Gomes e Guilherme Silveira e tornaram-se imediatamente uma das bandas residentes da feira popular do Jardim da Estrela. Descritos nos folhetos publicitários como os "Reis do Rock' n' Roll" tocavam todas as noites cerca de três horas de versões do que ouviam nas jukeboxes na altura - Elvis Presley, Bill Haley, Carl Perkins e Chuck Berry - assim como alguns improvisos, as suas actuações são então memoráveis. Nas palavras do vocalista "o Guilherme era como o Bill Black com o Elvis, era a mesma coisa, saltava e atirava-se para o chão. E eu quando canto, não vejo ninguém. Atirava-me ao chão de joelhos. Ficava eufórico”. 

É como registo desse verão de ’59 que Joaquim Costa decide gravar o hoje mítico acetato com aquele que é tido como o primeiro registo sonoro de rock 'n' roll feito em Portugal. Com duas faixas, Rip It Up e Tutti Frutti, estas consistiam em duas das versões que costumavam tocar nessas noites na Feira da Estrela. Gravadas numa rádio local, Rádio Graça, com um som rudimentar e primitivo, este acetato não deu origem a uma edição comercial na altura e teve de esperar quase cinquenta anos para ser editado pela Groovie Records.

Mas Joaquim Costa decide nesse mesmo Verão abandonar o conjunto por motivos pessoais, rejeitando as fãs e um convite para ir para os Estados Unidos. No entanto, a sua paixão pelo rock 'n' roll fez com que poucos anos mais tarde, em 1963, voltasse a cantar num projecto de nome Os Jotas do Rock juntamente com o seu amigo José Gouveia, guitarrista d’Os Tigres do Calipso. No ano seguinte Joaquim Costa volta a tocar em nome próprio mas quando surgem alguns problemas técnicos da qual resulta um uníssono "velhote! velhote! velhote! " da parte da audiência, decide retirar-se. "O rock ‘n’ roll, para [si], acabou nesse dia, 7 de Marco de 1964”, diz em entrevista, retrospectivamente. De qualquer forma, por essa altura, já se estava em anos de twist e de yé-yé

No entanto, no final da década de 70, Joaquim Costa começa a sair com os punks que conhecia na Feira da Ladra e voltou a tocar ao vivo, desta vez em casas ocupadas onde, segundo o próprio, "eram gajos e gajas a dormir no chão, comunas e drogas pesadas…Mas fizemos ali rock 'n' roll...". Em 1982 torna-se colaborador do programa de rádio Pedras Rolantes e em 2007, por ocasião do lançamento da reedição do seu acetato volta a tocar ao vivo, no Cabaret Maxime, em Lisboa. Joaquim Costa, conhecido como "o Elvis de Campolide", falece a 15 de Fevereiro de 2008, cumprindo a sua promessa de acompanhar "o rockabilly até morrer".

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Rock 'n' Roll em Portugal (1955-1959): Parte I



Introdução

É logo em 1955, com a estreia de Sementes de Violência (Blackboard Jungle, 1955) de Richard Brooks, que se ouve, pela primeira vez, rock ‘n’ roll em Portugal. O Ritmo do Século (Rock Around The Clock, 1956), Uma Rapariga com Sorte (The Girl Can't Help It, 1956), Rock, Rock, Rock (1956) seriam os seguintes nessa invasão americana que traria a um país isolado do mundo música actual, feita por e para jovens. Nas imagens à qual o rock ‘n’ roll servia de banda-sonora, viam-se danças, penteados, roupas, expressões, comportamentos que logo se começa a imitar, experimentando o que se tinha ao alcance. Assim, tal como o que se via no ecrã, jovens começam a tocar viola, imitam os penteados, improvisam roupas, e recorrendo a jukeboxes, colocadas em bares e colectividades, ouve e dançam os novos ritmos vindo da América. No final da década de 50 existia então, e finalmente, rock ‘n’ roll em Portugal.

É precisamente nesta altura que são feitas as primeiras gravações. Dividido em duas vertentes, por um lado assiste-se à adaptação do rock 'n' roll como um novo ritmo, inserido numa vertente mais jazzística, executada por orquestras de casino e conjuntos do Parque Mayer - é dentro deste registo que Shegundo Galarza e seu Conjunto grava Rock 'n' Roll (Ritmo com Teclas)” e Conjunto Jorge MachadoRock 'n' Roll Rag, ambos para a Discos Estoril -; por outro surgem aqueles que absorvem a música como parte de uma cultura, que a vivem como forma de afirmação e tomada de posição. É o caso de Joaquim Costa e os Rapazes da Estrela, que assinam a primeira gravação de rock ‘n’ roll feita em Portugal, datada de 1959, ainda que apenas em acetato e sem edição comercial; de Alfredo Laranjinha, que também grava um acetato nesse final de década, acompanhado por Luís Waddington do recém-formado Conjunto Nova Onda; e da Zurita de Oliveira que grava, esta sim, comercialmente, O Bonitão do Rock, uma música de contornos rock ‘n’ roll que tem a particularidade de ser da sua própria autoria. No entanto, passa despercebida. O seu terreno era outro, o fado...